Você já assistiu um filme ou série super desconhecido e sentiu aquela sensação palpitante de que outras pessoas mereciam descobrir aquela joia rara? Pois então, o objetivo dessa coluna é falar sobre produções culturais de modo geral que não estão no Mainstream e que por isso podem ser uma descoberta surpreendente de conteúdo para você se entreter e refletir. Vale ressaltar que a maioria das indicações citadas nesta coluna são difíceis de ser encontradas online e raramente estarão nas plataformas de Streaming.
“Parked”: sem apelação, filme fala sobre submoradia, orgulho, vergonha e vício, a partir da perspectiva de uma amizade improvável
“Parked” é um drama irlandês de 2010, dirigido por Darragh Byrne. O longa de 94 minutos ganhou em 2011 o prêmio de melhor filme no Festival Internacional de Cinema Mannheim-Heidelberg.
O filme tem uma premissa simples, mas é contado de maneira suave e tocante, com poucas falas, e muitas cenas apenas visuais. A história central gira em torno de Fred Daly, (Colm Meaney) um homem de meia idade, que após voltar para a Irlanda sem ter onde morar, acaba sobrevivendo dentro do seu carro. Fred busca conseguir os benefícios sociais necessários para deixar de morar em seu carro e conseguir uma casa, mas um dos seus principais conflitos internos é o orgulho e a vergonha pela sua situação.
O ponto de virada na vida do protagonista é quando ele conhece o jovem Cathal O’Regan (Colin Morgan), um rapaz de 21 anos, que é expulso de casa e passa a morar em seu carro no mesmo estacionamento que Fred. Os dois se tornam vizinhos e, improvavelmente, amigos. Cathal rompe rapidamente as barreiras da vergonha que Fred mantinha em torno de si por conta de seu status e ensina o homem mais velho a como conseguir mais conforto e descobrir pequenos prazeres gratuitos. Assim, ambos passam a frequentar o clube aquático juntos, a passear de carro e fazer exercícios, coisas que Fred sequer imaginava antes.
O vício em drogas de Cathal é abordado de uma maneira delicada no filme. Cathal não é o estereótipo de um viciado. Ele é um rapaz inteligente e sensível, que sente falta da família e que respeita Fred. Inclusive, faz de tudo para que Fred tenha uma chance de conseguir uma moradia diferente e comece a realmente viver sua vida, através de novas experiências, incentivando o mais velho a se aproximar das pessoas que antes ele tinha vergonha de se aproximar.
É curioso perceber como Cathal diz “I need a Brake” (eu preciso de uma pausa), antes de consumir drogas, porque isso demonstra de modo sutil, como sua situação é tão tensa devido às relações familiares e às dívidas com traficantes, que ele só vê formas de escapar de sua realidade através das drogas. Mas a amizade com Fred traz normalidade para sua vida pela primeira vez em muito tempo.
Vale destacar também que as atuações são incríveis. Colin Morgan imprimiu maneirismos tão próprios ao personagem, que é possível entender tudo o que ele diz apenas pelo olhar. E não é exagero. Veja bem, o filme só foi distribuído em países de língua inglesa. Mesmo não sendo nada fluente e não dispondo do recurso das legendas, afirmo ser possível captar e sentir todas as mensagens apenas olhando suas expressões.
O filme é um drama. Infelizmente, se você busca por finais felizes, não é uma boa recomendação. Mas é bastante emocionante ver a evolução de Fred, sua desconstrução, libertação de sua vergonha e medos, o preconceito que tinha com outros e consigo mesmo. É triste ver a jornada de Cathal. Mas acima de tudo é bonito ver o momento em que os dois se encontram no meio do caminho.
Maria Fernanda é jornalista formada pela UEPG e atua há cinco anos como Copywriter, já tendo passado por diversos segmentos do marketing. Estagiária em Letras, ela é também catequista voluntária e palestrante, aprovada pela Lei Paulo Gustavo com projeto de combate a desinformação. Tem também um conto publicado na Amazon e investe tempo pessoal na escrita independente de reportagens.
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