Por Maria Fernanda de Lima
Infelizmente, a normalização e frequência da violência sexual em quase todos os tipos de séries e filmes tem se tornado cada vez mais comum e, por si só, isso já é problemático. Alguns roteiristas, no entanto, vão além, e utilizam o estupro e/ou abusos como recursos narrativos para amarrar a história. Esse é o caso da série ficcional Outlander, baseada nos livros homônimos da autora Diana Gabaldon.
Desde o inicio da série fica nítido que Outlander é mais uma narrativa clássica do gênero épico que oferece uma grande quantidade de cenas de sexo (consensual) como fanservice para os fãs – assim como Game of Thrones- ou seja, cenas que só são feitas para entreterimento dos fãs. O problema é que roteiristas pesam a mão e parecem não se importar com o exagero de cenas de violência sexual.
Logo no primeiro episódio, Claire (a protagonista) sofre uma tentativa de estupro, e é salva pelo bando de Jamie (protagonista masculino, com quem ela se casa). No final da primeira temporada, temos ainda o estupro de Jamie, uma cena pesada, repleta de tortura, que o traumatiza e motiva o casal a fugir para a França. Lá, Claire cede ao estupro do rei Luís XIV para que este liberte Jamie da prisão.
Na terceira temporada vemos o sequestro e estupro de Ian, personagem secundário, o que leva os protagonistas a viajarem até a Jamaica onde vários eventos importantes para a série acabam ocorrendo, incluindo a morte de uma grande vilã.
Já na quinta temporada, vemos Brianna, filha de Jamie e Claire, também ser estuprada ao viajar para o passado para tentar salvar seus pais. Ela engravida e isso coloca à prova seu relacionamento com o noivo. E por fim (até agora, já que a série ainda está em lançamento) Claire, novamente (já foram três?) é estuprada. Dessa vez, por vários homens de uma vez, motivados pela raiva e oposição aos discursos progressistas da mulher.
Jamie, Claire e Brianna, os três protagonistas da série Outlander, sofrem estupros ao longo das sete temporadas da produção. Imagem: elaborada por Maria Fernanda de Lima.
Mas afinal, além do fato de ser repetitivo, existe outro problema no exagero de estupros na série? Sim! E são vários. A partir do momento que os roteiristas e autores decidem usar isso como um recurso narrativo, eles também automaticamente passam a imagem de banalização da violência. Ou seja, o público que consome essas séries passa inconscientemente a considerar cada vez mais normal esse tipo de comportamento! O segundo problema é que o abuso é utilizado na trama para fazer o espectador simpatizar com a vítima: “se a personagem é estuprada, todos vão ficar com muita pena dela e vão passar a ter empatia por suas ações e personalidade, mesmo que sejam ruins”. O terceiro problema, e talvez o pior de todos, é a fetichização do estupro na série!
A fetichização ocorre quando, durante a cena de estupro, as imagens privilegiam de forma sensual o corpo da vítima, novamente, para que isso sirva apenas de entreterimento para o público. Isso é absolutamente condenável do ponto de vista ético de quem produz TV, pois, usa-se de uma representação de violência real, super traumática, para sensualizar.
Um exemplo em Outlander é durante o ocorrido com Jamie na primeira temporada. Os diversos flashbacks do personagem, dando ênfase na sua nudez e nele dizendo que se sente culpado por ter ficado ereto, mostram claramente o objetivo de fetichização do momento que ele passou.
Por isso, questionar e pressionar quem produz o que nós assistimos é preciso: afinal, por que vocês banalizam o estupro? Por que não usar essas representações apenas quando for, de fato, necessário para a trama? Por que não podemos todos estudar mais sobre isso para tratar com mais responsabilidade essa questão?
Maria Fernanda é jornalista formada pela UEPG e atua há três anos como Copywriter, já tendo passado por diversos segmentos do marketing. Cursando Licenciatura em Letras, ela é também voluntária em ocupações catequéticas, através das quais utiliza do espaço de ensino para perpetuar valores de ética, filosofia e moral. Para promoção de conhecimento, entreterimento e desenvolvimento pessoal, investe na escrita independente de reportagens e romances.
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