Por Maria Fernanda de Lima
Se você esteve na Terra no último mês (ou na internet), provavelmente viu algo sobre o caso Larissa Manoela, não é mesmo? A trajetória da atriz, que abriu mão de R$18 milhões após uma batalha familiar sobre a gestão de seus negócios, expõe uma realidade chocante e lamentável: a da violência patrimonial contra artistas. Principalmente, contra artistas menores de idade. Violência essa que esteve sempre propositalmente naturalizada e obscurecida pela glamourização da indústria do entretenimento, em todo o mundo.
A violência patrimonial é pouco reconhecida e extremamente banalizada. Mas nunca deixou de ser uma violência. Ela envolve o controle, dano ou destruição dos bens materiais de uma pessoa, com o objetivo de exercer poder e controle sobre ela. Isso abrange desde a apropriação indébita de propriedades até a negação de acesso aos recursos financeiros e a destruição de pertences pessoais. É uma forma de desmerecimento do trabalho, exploração e domínio que ultrapassa os aspectos materiais e limita a pessoa psicológica e emocionalmente.
A indústria do K-pop é um destaque quando falamos de violência patrimonial, pois nela essa prática é quase onipresente e envolve várias dimensões, tanto por parte da família quanto das empresas envolvidas. Os artistas frequentemente entram em programas de trainee, onde não recebem remuneração adequada pelo seu trabalho. Eles também assinam contratos desfavoráveis que retiram uma grande porcentagem de seus ganhos futuros. Isso pode incluir cláusulas que limitam sua parte nos lucros ou estipulam longos períodos contratuais. Os astros podem receber um salário mínimo ou nenhum salário durante os anos de treinamento, enquanto as empresas se beneficiam de sua mão de obra sem custos.
Após o debut (estreia dos cantores/bandas), as empresas de entretenimento frequentemente têm controle total sobre as finanças, incluindo o gerenciamento de contas bancárias dos artistas e despesas pessoais. Isso pode levar a situações em que os idols não têm acesso direto aos seus próprios recursos financeiros.
O impacto da exploração financeira não se limita apenas ao aspecto econômico, mas também afeta profundamente o bem-estar emocional dos artistas do K-pop. Condições de trabalho desfavoráveis, contratos opressivos e apropriação indevida de ganhos minam sua qualidade de vida, gerando debates urgentes sobre direitos trabalhistas, principalmente se levarmos em consideração que a maioria dos idols entra na indústria ainda menor de idade.
A violência patrimonial contra menores de idade é facilitada em vários setores, não só no K-pop. Com o argumento de que a criança não pode gerir seus ganhos, as famílias e/ou empresas se apropriam e tomam decisões sobre o patrimônio acumulado do artista. Foi o que aconteceu no caso da atriz Larissa Manoela. E é o que acontece também há muitos anos na história da música brasileira.
A violência patrimonial também se manifesta na cultura da música sertaneja, onde muitos artistas começam suas carreiras precocemente e assumem a responsabilidade de sustentar suas famílias. Um exemplo notório é o da dupla Chitãozinho e Xororó, que desde muito crianças foram responsáveis por parte significante do sustento da família- de oito irmãos- a trajetória da dupla e a responsabilidade financeira que tiveram desde muito jovens está retratada na nova série do Globoplay, “As Aventuras de José e Durval” (2023)
A história desses artistas, que sacrificaram a infância em nome da música, levanta questões profundas sobre a exploração e o abuso de patrimônio. O caso de Larissa Manoela é apenas um exemplo de uma realidade mais ampla, em que pais, empresários e outros agentes de violência passam a limitar a vida e assumir o controle por um lucro que é fruto da arte e do trabalho de jovens e crianças. Vale lembrar que a administração dos bens e ganhos do artista menor de idade deve ser supervisionada. Inclusive quando a família é a responsável. As leis e regulamentos que protegem esses artistas precisam ser aprimorados e aplicados de forma rigorosa. Afinal, toda violência deixa marcas, inclusive a patrimonial!
Maria Fernanda é jornalista formada pela UEPG e atua há três anos como Copywriter, já tendo passado por diversos segmentos do marketing. Cursando Licenciatura em Letras, ela é também voluntária em ocupações catequéticas, através das quais utiliza do espaço de ensino para perpetuar valores de ética, filosofia e moral. Para promoção de conhecimento, entreterimento e desenvolvimento pessoal, investe na escrita independente de reportagens e romances.
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