Neste mês, a cidade perdeu mais um imóvel histórico. A casa azul, localizada na rua Comendador Miró, ao lado do Clube Estância, era uma daquelas casas que tinham a sua data de construção eternizada na fachada. Ano passado, ela completou 100 anos.
Agora o terreno está limpo e não há como reconstruir esse imóvel. Uma forma de preservar esses prédios de importância cultural e arquitetônica para a cidade é o processo de tombamento. Desta forma, o imóvel permanece legalmente seguro, pois não pode ser demolido. Mas o processo de tombamento é complicado.
A casa azul, não é o único exemplo que temos na cidade sobre a preservação dos imóveis. Ponta Grossa é uma grande expoente de imóveis Modernistas. A casa demolida na rua Coronel Dulcídio de projeto de Miguel Juliano retrata esse cenário como comenta Carlos Mendes Fontes Neto, mestre em Planeamento e Projecto Urbano pela Universidade do Porto, em Portugal. O pesquisador cita mais exemplos de prédios que não foram preservados. “Tínhamos edificações que além de representar diferentes épocas, representavam eventos e acontecimentos que fizeram a construção da cidade, como por exemplo a antiga Catedral (ícone da onda de demolições que assolou a cidade nos anos 70 do século passado), o Palacete do Bispo, o Foto Bianchi, a Cervejaria Antarctica (antiga Adriatica), e outras tantas construções que poderiam ter sido conservadas.” relembra.
Carlos Mendes Fontes Neto pontua que essas construções foram demolidas e no seu lugar não surgiram edificações que contribuíssem na melhoria da qualidade do ambiente urbano.
Para Marcus Hundsdorfer, designer, a destruição dos prédios é uma perda cultural incalculável. “Um prédio não é uma simples estrutura habitacional ou comercial. Com o tempo, edificações vão tomando sua própria personalidade, parte da comunidade assim como as pessoas.” observa. Hundsdorfer comenta que, mesmo ao andar pela cidade e observar os prédios estamos exercendo o respeito não só pela história das edificações mas também por aqueles que passaram por elas.
A foto mostra o terreno após a terraplanagem, em julho de 2023. Foto: Jessica Allana Grossi
Preservação ambiental em Ponta Grossa
No dia 18 de julho, o santuário de Vila Velha foi declarado como patrimônio histórico. A decisão dos Conselheiros do Conselho Municipal do Patrimônio Cultural – COMPAC foi unânime. Inaugurado em 1979, o imóvel estava desativado desde 2007. Embora o prédio tenha seu valor histórico e cultural, Mário Sérgio de Melo, geólogo, professor aposentado do Departamento de Geociências da UEPG e autor do livro Formas rochosas do Parque Estadual de Vila Velha (UEPG, 2007), destaca que do ponto de vista ambiental ele é um erro. Isso porque o prédio foi construído em uma área de preservação ambiental.
Porém a lei que instaura o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza foi publicada em 2000 e o santuário foi construído antes da sua instauração. “A Ermida representa o patrimônio cultural. O Parque representa o patrimônio natural.” destaca o pesquisador. Neste caso, para ele, foi levado em conta o patrimônio cultural. Ele relembra que foram cometidos outros erros com o Parque. “O kartódromo, o elevador na Furna 1, a piscina… Alguns destes erros foi possível corrigir. Outros não.” aponta.
Para o pesquisador, o Patrimônio cultural é memória, identidade e raiz e representa a emancipação e iluminação como seres humanos, mas inevitavelmente o interesse que predomina na questão da preservação ainda é o ego ou econômico. “Não temos ainda conselhos que tenham suficiente equidade para conduzir satisfatoriamente impasses como o tombamento ou não da Ermida dentro do PEVV. E muito menos temos políticas públicas adequadas que motivem os proprietários a aderirem ao tombamento.” ressalta Melo.
Caminhos para a preservação do patrimônio cultural e ambiental
Segundo dados disponíveis no site da Secretaria Municipal de Cultura, existem 60 imóveis tombados em nível Municipal e 10 imóveis em nível Estadual. Apenas 12 desses imóveis são de responsabilidade do Município.
Carlos Mendes Fontes Neto pontua que há vários caminhos para a melhora na preservação de imóveis na cidade, desde mudanças na mentalidade da população, incentivo de políticas públicas voltadas a manutenção desses patrimônios e planejamento urbano voltado a permitir que as edificações tenham funções sociais e não apenas econômicas.
Para Mário Sérgio de Melo, Ponta Grossa não preserva seu patrimônio cultural, nem seu patrimônio natural. A mudança para ele virá da própria cultura e do tempo. “Vamos aprender, ainda que demore. E, sendo formado numa Ciência Natural, acredito que a natureza é que vai nos ensinar. Infelizmente, da pior forma: vamos aprender pelo erro, e pelas consequências do erro.”
#PraCegoVer: Primeira foto: Casa Azul, construída em 1922 com várias portas e janelas.
Segunda foto: Terreno com a terraplanagem concluída. A foto foi tirada em julho de 2023.
Vejo sempre estas matérias criticando os proprietários que põe no chão seus imóveis, cujo custo de manutenção é alto devido à deterioração, cupins, etc. sempre falam em tombamento, mudar a consciência dos proprietários, mas soluções viáveis para mantê- las ninguém dá. Há leis e verbas federais que deveriam ser estudadas e levadas ao conhecimento dos proprietários, aí quem saber haja interesse em preservar, senão será este eterno dilema.
Esse é o cerne da questão. A falta de politicas publicas para incentivar a a manutenção das edificações é flagrante. Só a existência de leis significa na prática nada. A questão só avança quando o poder público investe na reabilitação do espaço urbano, trazendo subsídios e oferecendo vantagens para os proprietários. É necessário vontade politica para isso, e infelizmente falta cultura aos nossos governantes para defenderem isso. Em nenhum momento responsabilizei qualquer proprietário pelo fato, apenas fiz reflexões sobre a necessidade de preservar e democratizar o espaço público através da manutenção das edificações que representam nossa identidade urbana.