PERFIL:  ‘Viemos trazer o Caos’

Conheça a banda ponta-grossense Pangare

O Thrash Metal é um subgênero do heavy metal bem característico. Os amantes desse estilo musical agressivo, rápido, com riffs marcados e solos guitarra experimentais, velozes e técnicos, são assim como suas músicas preferidas. 

Mais do que um subgênero, o Thrash Metal é um tipo de personalidade, como me informou Gustavo Camargo, vocalista da banda Pangare, promissora no cenário thrash da cidade de Ponta Grossa. 

A primeira vista, olhando os músicos da banda, percebemos que eles são, de fato, uma banda de Thrash Metal, mas longe de serem agressivos na entrevista, percebemos que eles só foram muito rápidos. Não no sentido ruim, mas havia sempre uma resposta para todas as minhas perguntas na ponta da língua. Articulados, confiantes e apaixonados pelo que fazem, os quatro integrantes me contaram um pouco como é o processo de criação, os shows, a forma como se posicionam no mundo e o que planejam fazer no futuro. 

Gustavo e Gabriel Gibson em um show no Capivaras. | Foto: Divulgação

Hashtag Metal 

Pangare, que foi criada em 2021, está produzindo músicas autorais desde 2022. Um de seus lançamentos, Slaves of Mediocrity, está no ar desde 26 de outubro nas plataformas digitais. 

Hoje, a  banda conta com fãs de todo o Brasil, inclusive de estados bem distantes como Belém do Pará. Tem em média 200 ouvintes mensais e já chegou a 250 ouvintes. Já foi divulgada até por perfis grandes de metal brasileiro nas redes sociais. Neste post em específico, a banda alcançou mais de 10 mil curtidas. 

Esse crescimento se deve ao próprio trabalho da banda, principalmente com comunicação e a aproximação com o seu público. Os integrantes se aproveitaram de todos os espaços gratuitos que a internet oferece para lançar o seu som. Na hashtag de metal, no TikTok, é possível ver vídeos editados pela banda de covers e ensaios. E se você comentar em um post no Instagram da banda, com certeza vai ter uma resposta bem ao estilo Thrash. 

Mas é justamente por isso que os fãs gostam da banda. A proximidade faz com que se conheça, às vezes até um pouco demais, todos os aspectos de criação. Nos shows, os integrantes comentam que a receptividade é muito bacana. 

O vocalista, Gustavo Camargo, mais conhecido na cena como Peladão (perguntei o motivo do apelido, mas só recebi risos e olhares como resposta), relembra que o melhor show que a banda teve foi em Telêmaco Borba e o restante da banda concordou com ele. “Nós éramos artistas de fora, lidos como artistas mesmo” , destaca. O show, lotou dois andares do estabelecimento e até trouxe a Polícia da cidade por conta de uma briga (que não teve nada a ver com a banda!). 

O público aproveitou para tirar fotos com a banda de outra cidade e até pediu lembranças, como conta o baterista Luiz Antonio Venâncio Junior, mais conhecido como Venâncio. “No show, quebrei as baquetas e tal e um menino pediu de recordação”. Venâncio entregou as baquetas quebradas e elas estão lá em Telêmaco Borba agora, guardadas como uma relíquia. 

Show em Telêmaco Borba. | Foto: Divulgação.

Sangue, mosh e energia 

Os shows da banda Pangare sempre são o evento com E maiúsculo! Nosso site, noticiou o show que aconteceu neste mês, no dia 19

Embora eu, particularmente, nunca tenha visto, consigo imaginar pela descrição dos integrantes da banda. João Vitor Vogler, o Feijão, baixista da banda, me contou que em todo show há um ritual. A banda passa sangue em si mesma. É tudo pelo Thrash Metal. 

A entrada da banda, como explica Gabriel Gibson, mais conhecido como Purgatório, é sempre berrando as seguintes palavras: “Viemos trazer o caos”, seguida de gritos bem característicos do Thrash Metal. “É música pedreira mesmo, com muito mosh, e a gente sempre mente que um integrante virou pai” relembra Purgatório e ri. 

Em 2022 e em 2023, a banda teve o seu calendário de apresentações cheio. Em 2023, até agosto, se manteve assim. Agora, após o mês de agosto, a banda me confidenciou que se fechará um pouco para a gravação do seu primeiro álbum completo. 

Embora Pangare já tenha cinco músicas autorais gravadas, o desejo é lançar um álbum completo e um clipe ainda neste ano, no máximo no começo do ano que vem. As composições serão ainda mais brutais, com traços de Death Metal (um subgênero também do heavy metal), mais técnico do ponto de vista sonoro e com, é claro, muito Thrash Metal. 

Quem me contou do clipe foi Feijão, o baixista. Ele acredita que o clipe musical, impulsiona a banda ainda mais. Já o álbum, Peladão me contou que será sobre “crenças limitantes”. 

Mesmo assim, com esse período sabático, a banda já tem shows agendados para setembro em um festival e em algum momento participará de uma festa de Motoclube. 

A banda faz por merecer. Ensaia todas as semanas e perto dos shows, os ensaios aumentam. No dia da entrevista, os integrantes estavam reunidos com os seus instrumentos para um ensaio, em plena segunda-feira, no CBGBar, o famoso bar do Régis, na Palmeirinha. 

Os integrantes levam a sério a profissão de músicos. “Parecemos uns piás, nada com nada, brincando de fazer música, mas a gente leva esse trabalho muito a sério” confidencia o vocalista Gustavo Camargo. “É como um trabalho mesmo, fico bravo quando as pessoas não veem como um trabalho” relata Venâncio. 

Cada integrante é responsável por uma parte do gerenciamento da banda. Os shows, os contatos com o público, ensaios, gravações, divulgação e até a venda das camisetas é administrada com o intuito de fazer crescer cada vez mais o grupo. 

Foto de ensaio da banda. | Foto: Divulgação

O início da banda 

Como ninguém nasce com 1.80 e ganhando dinheiro, a banda Pangare também foi apadrinhada nesse processo. Lá no seu início, em 2021, já recebeu auxílio importante da cena da cidade e demonstra agradecimento por esse ato. Ainda é muito apoiada pelas bandas mais estabelecidas do município, da mesma forma que pontua que já tem “atritos” com outras bandas. Esse ato, tanto quanto de ajudar e de sentir ciúmes, faz parte do cenário musical em todos os gêneros, não só no Heavy Metal. 

A banda me contou que só tocou no Capivara’s Bar graças a banda Lands of Souls, seus padrinhos. Eles foram convidados a fazer a abertura do show. No spotify, a banda tem uma composição conjunta com o Lands of Souls

Como sabem a importância desse ato, convidaram uma banda iniciante para abrir seu show, no dia 19 de agosto, retornando assim o que receberam no início. É assim que as bandas de Heavy Metal se fortalecem no cenário da cidade, já que é um gênero que ainda carrega estigmas e não é convidado a entrar em todos os estabelecimentos da cidade. 

Essa troca, com uma banda consagrada, é de extrema importância, como observa Venâncio ao dizer que a troca de dicas com o pessoal mais consolidado na cidade é o que auxilia no começo. Feijão relembra que no CBGBar, certa vez, a banda conheceu a banda Vulture. 

Formada nos anos 90, a banda do interior de São Paulo iniciou a carreira assim como os músicos da Pangare. Muito novos, tocando onde deixassem, a banda Vulture se firmou no cenário e hoje é uma das principais expoentes do Death Metal brasileiro. A troca feita entre os músicos da Pangare e os músicos da Vulture foi especial. “Acho que eles se viram na gente porque começaram como a gente”, relembra Feijão. 

Feijão e Gustavo Peladão em show no CBGBar. | Foto: Ana Cochinski.

Influências e posicionamentos

Um fato curioso sobre a banda é que seu baterista, Venâncio, caiu de paraquedas no Thrash Metal e no Death Metal neste ano. Convocado às pressas devido um atrito anterior entre o baterista e o restante do grupo, Venâncio aceitou o desafio de tocar um subgênero que não ouvia muito. 

Hoje, o baterista ama o Thrash Metal. No início, começou sua carreira no punk. Estava numa vibe mais rock progressista também. Tinha um projeto próprio especial, mas largou ele assim que foi convidado a tocar na banda. Foi o Peladão que o chamou. “Sabe por que eu te chamei? Porque você postou um cover ótimo do Slipknot”. Venâncio respondeu “Ah, aquilo?” com uma ponta de humildade escondida. “Estava muito bom!” o vocalista retrucou. 

Ele começou na banda, primeiro em um show, onde foi jogado de paraquedas. Depois, ajudando em duas composições em 2023. Os outros integrantes confidenciaram que ele passou mal no primeiro show. “É, no primeiro show eu passei mal e vomitei”, relata Venâncio. Os amigos justificaram dizendo que era nervosismo. “Era a minha primeira vez no palco. Aprendi muito com eles “, comenta o baterista se referindo ao resto da banda. 

Venâncio sempre foi incentivado pelo avô a tocar bateria. De passado escuso, o avô tocava em lugares diferenciados. “Ele era baterista de samba e tocava às vezes na zona” confidência Venâncio rindo “e eu fui para o pior ainda!” comenta se referindo ao Thrash Metal. Os pais, de Venâncio, prefeririam que ele participasse de uma banda mais “leve”, porém, gostaram muito do show que foram, no Capivaras Bar. 

No geral, os músicos da banda recebem um bom apoio da família, que é importante nesse caso, já que a grande parte está na faixa dos 18 anos. Gabriel Gibson, o mais velho com 20 anos, aprendeu a tocar guitarra na pandemia. Aproveitou o momento de isolamento para aprender o que sempre quis fazer. 

O vocalista e guitarrista, Gustavo Camargo, sempre teve essa influência desde pequeno. De todos, parece ser o mais apaixonado pelo que faz. Eufórico, sempre destaca o potencial de todos os outros integrantes. Ele conta que conheceu João Vogler quando era pequeno porque estudavam na mesma escola. Mas os dois se odiavam quando eram crianças. “Eu e o Feijão somos almas gêmeas, praticamente!” Peladão diz brincando ao fazer referência do passado extremamente parecido que tiveram. A diferença é que, Feijão recebeu a influência dos seus irmãos do Rap, que também ouviam as clássicas do rock como Guns, Metallica e Led Zeppelin. O irmão de Feijão acompanha de perto todos os shows na cidade da banda, sendo um grande incentivador da Pangare. 

As influências dos quatro músicos estão gravadas no Spotify em uma playlist com o nome do integrante e suas bandas preferidas. Me confidenciaram que talvez essa playlist esteja um pouco desatualizada, mas que foi feita com esse objetivo. 

Não sei quem me disse, mas ao decorrer da entrevista ouvi um “Sepultura é a melhor banda de metal do mundo!”. Além de Sepultura, os músicos têm um carinho especial por Gojira, Krisiun, Death, Anthrax, Crypta e Slayer, entre outras. 

Os posicionamentos da banda conferem com o perfil Thrash Metal. Para eles, o Thrash Metal é extremamente importante. “O movimento surgiu justamente em um momento onde só se considerava música boa a música erudita clássica. Aí vem o Thrash e quebra com isso, dizendo que a música não tem o papel de ser bonita” confirma Peladão. 

Purgatório reitera dizendo que o Thrash foi uma revolução na música e que continua sendo. Feijão relembra que ele foi inspirado no Punk. Principalmente na forma como crítica às estruturas da sociedade. 

Feijão trabalhou na composição do primeiro EP e conta que ele foi criado com o objetivo de contar uma história, do início ao fim. As músicas fazem críticas a sociedade de uma forma poética e chocante, como a primeira música lançada pela banda chamada Slasher, que foi escrita com os olhos de um serial killer. Justamente por repudiar este ato, a música surge como uma forma de expressão e crítica ao sistema. “Foi escrita com o objetivo de chocar com o que se passa na mente de alguém assim” explica Gustavo Camargo, vocalista e guitarrista. A música aborda um serial killer brasileiro, pouco divulgado.

Outra música do primeiro EP da banda retrata também um caso chocante pouco divulgado é o massacre de Barbacena, como relembra João Vogler, o baixista da banda. “Foi um caso muito abafado pela mídia”. Ele me conta que o EP Carnage Elange começa pela colonização do Brasil e encerra com a parte podre do Brasil. 

Venâncio, integrante desde 2023, tocando bateria em um show da banda no CBGBar. | Foto: Ana Cochinski.

Futuro Pangare

O que esperar do futuro de uma banda que passou uma virada de ano gravando um dos seus principais singles? Certamente mais música. O planejamento é sempre continuar crescendo, como destacam os integrantes. 

Além do novo álbum e dos shows e festivais que já estão marcados, a banda quer se concentrar também na sua linha de roupas. Atualmente uma boa parte da renda da banda vem de suas camisetas, que são vendidas nos shows e pelo instagram oficial da banda

No futuro, a Pangare quer um estúdio próprio para ensaios e gravações. Como estão fluindo as coisas, não duvido que isso aconteça em breve. A vontade de crescer é proporcional à profissionalização dos próprios músicos que levam muito a sério o trabalho de trazer o caos ao mundo.